Imagine a seguinte cena: você chega em casa depois de um dia inteiro de trabalho e se depara com um dos pares do seu sapato predileto estraçalhado no chão da sala. Em seguida você observa que o seu cãozinho se encontra em um dos cantos da casa todo encolhido e com aqueles olhos de arrependimento, logo você presume que aquele indivíduo é o culpado, mesmo que existam outros cães na casa.
As pesquisas já conseguiram comprovar que os cães experimentam alguns dos mesmos sentimentos que nós seres humanos como amor, alegria, raiva, medo e ansiedade. No entanto, alguns psicólogos consideram que os animais não sentem emoções mais complexas que exigem a consciência de si mesmos como culpa, orgulho e vergonha.
Outra importante consideração sobre o mito do sentimento de culpa nos cães é que parece muito pouco provável que os mesmos possuam a capacidade de pensar no passado e refletir sobre seus atos mesmo que tenham acontecido há pouco tempo. Diferente de nós humanos, os cães não tiram conclusões de causa e efeito com base na ocorrência de dois episódios que ocorreram em sequência, logo os cães não praticam a introspecção. Por exemplo, um cão nunca vai pensar da seguinte forma: “Eu estraguei um dos pares do sapato, logo receberei um castigo assim que meu tutor chegar em casa”.
O que acontece em seguida, na maioria das vezes, quando um cão faz algo de “errado” na opinião do seu tutor na ausência dele é o castigo ou até mesmo agressões físicas. Mas se os cães não são capazes de associar aquela punição ao evento que ocorreu algumas horas atrás o que o cão está aprendendo? Eles simplesmente aprendem que quando o seu tutor chega em casa algo inesperado pode acontecer, como receber um carinho ou ser punido e agredido.
Essa incerteza e imprevisibilidade de como o cão será recepcionado por seu tutor, se repetida um número suficiente de vezes, pode causar uma ansiedade tão grave que pode arruinar a vida de um cão sensível.
Então o que realmente acontece com o comportamento dos cães se eles não se sentem “culpados”? Lembre-se que os cães são excelentes leitores de linguagem corporal. Eles conseguem detectar sutis sinais de decepção e raiva que possamos expressar em nosso corpo ou tom de voz ao chegar em casa e se deparar com uma bagunça. Por isso, sinais apaziguadores (calming signals), que muitas vezes são confundidos com sinais de submissão (proveniente da já desmistificada teoria da dominância), são oferecidos com o propósito de reduzir a intensidade do castigo ou reconciliar-se com o tutor para que a sua ansiedade desapareça. Alguns desses sinais são: agachar, rolar e mostrar a barriga, lamber os lábios ininterruptamenre, virar a cabeça ou o corpo para o lado oposto, levantar a pata e etc.
Por isso, jamais puna o seu cãozinho por causa de um mau comportamento que ocorreu há algum tempo atrás. Isso pode trazer problemas comportamentais sérios. Se precisar, procure ajuda especializada de um profissional do adestramento positivo.
*Texto adaptado do livro Cão Senso de John Bradshaw.
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